quinta-feira, 30 de outubro de 2008

A Constituição invisível


"The invisible constitution" é o último livro de Lawrence Tribe, o constitucionalista de Harvard, que defende que ao lado da Constituição escrita americana existe, reconhecida pela sociedade e pela Suprema Corte Americana, tanto por conservadores como por liberais, uma Constituição invisível que traça princípios fundamentais que são consensualmente reconhecidos como indispensáveis para a ordem constitucional americana, tanto importanes quanto o que consta expressamente do texto.

A indissolubilidade da União e o Estado Democrático de Direito (rule of law) são alguns destes princípios invisíveis que todos reconhecem como parte da Constituição americana, sem eles a Constituição não seria o que é e, não seria exagero afirmar, perderia a sua identidade.

O livro assume, por outro lado, que a jurisprudência americana tem mais cuidado em rever posicionamentos jurisprudenciais relativos a questões constitucionais do que questões legais, o que deriva da dificuldade de emendar uma Constituição: uma Constituição rígida tende a ser mais dificilmente alterada pelo Congresso do que pelo Judiciário, que assume, porém, o fardo de se manter fiel aos precedentes sem negligenciar as mudanças históricas que justifiquem uma alteração na interpretação sem mudança do texto, o que nem sempre pode ser feito pelo processo político.

Todo país tem sua Constitiução invisível, ainda que esta seja caracterizada por um Estado de quase anomia, em que a anormalidade jurídica é definidora do sistema e não um ruído destoante. No Brasil, decorridos apenas 20 anos da Constituição, o constituinte não teve pudor de incluir quase tudo o que pode em seu prolixo texto e o Congresso e o Poder Judiciário não tem pudor em mudar a interpretação e o texto toda vez que for necessário ou apenas conveniente.

No Brasil, não é a Constituição invisível que ajuda a construir a estabilidade do sistema é a própria Constituição visível que ajuda a tornar o sistema instável. Já passou da hora de (re)vermos o que precisa ser revisto.

Enquanto não fizermos isso resta o consolo nada desagradável de apreciar Cézanne, o pintor do invisível.

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