terça-feira, 8 de julho de 2008

Em busca do tempo perdido

"Em busca do tempo perdido" é o grande clássico de Marcel Proust, um dos grandes romances do século XX.
É, de fato, um grande romance: a começar pela impressionante extensão, que obrigou o autor a publicá-lo em vários volumes como livros 'autônomos'. Dizem que Guimarães Rosa, em seus tempos de Diplomata, sumiu por uns dias e, encontrado depois, disse que havia se isolado para ler "Em busca do tempo perdido". Carlos Drumond de Andrade e Mário Quintana gostaram tanto do livro que se tornaram os tradutores de uma de suas edições brasileiras.

Mas o que faz um autor dedicar vários anos da sua vida para escrever um livro tão extenso?

Certamente, o que conduz tantos leitores qualificados a dedicar inúmeras horas para lê-lo: o livro revelta tanto sobre o universo vivido por Marcel Proust quanto sobre o universo vivido por cada um de nós.

"Em busca do tempo perdido", não fala de mim, nem de você, mas fala, o tempo todo, para cada um de nós e revela, nos personagens (como em Swann ou Odette, por exemplo), tantas idéias e tantos mundos em um mundo só que ficamos completamente atormentados, arrebatados pela delicadeza do autor e pelo universo que cria.

É neste universo, ao mesmo tempo tão sútil e tão denso, que no quotidiano se revela a gradiosidade oculta da vida, até mesmo na existência mais frívola e nos instantes mais irrelevantes e casuais surge o significado mais pleno, como no clássico episódio da madeleine do livro, o bolhinho francês que ao ser saboreado na vida adulta pelo personagem permite que se revele, intacto, o gosto de um passado perdido que não volta mais, mas ainda existe, pois só assim é possível que seja revivida a expriência em toda sua inteireza, ainda que por um átimo e sem que sejamos capazes de escolhar a hora. Na obra, como navida, nada volta e, ao mesmo tempo, tudo está sempre voltando.

Todo tempo na vida é, de algum modo, sempre um tempo ganho e um tempo perdido e a teia tão complexa de relações que permeiam todo instante é quem dá significado à vida: queiramos, gostemos, tenhamos consciência ou não...

Toda vida, por mais frívola, é também vida, com tantos significados possíveis e imagináveis que até os mais vazios personagens do fim da era vitoriana acabam revelando uma humanidade tocante. Proust denuncia a vida materialista da burguesia do início do século XX, mas acaba demonstrando que até a vida vivida da maneira mais mesquinha é capaz de emocionar e tocar.

No atual mundo, ainda mais dispersivo e materialista, recorrer à Proust é relembrar os sentimentos e percepções que tentamos calar mas que existem e falam tanto sobre nós quanto nossas vozes eloqüentes e nossas falsas aparências mal disfarçadas.

Ler Proust é reler, através do seu mundo, o nosso mundo, ampliando os nossos horizontes, a nossa percepção e a nossa sensibilidade. Ao final de qualquer dos volumes, a impressão que se tem é que lê-los pode até ser difícil e doloroso, mas nunca um tempo perdido.

"Em busca do tempo perdido" é um livro para se ler, reler, e ler de novo, com a certeza de que nossa vida termina sendo iluminada e, em cada vez, se pode fazer uma nova resenha, um novo comentário e se desenvolveram novos pensamentos, novas e multiplas faces para a vida e para o livro.

Para que perder tempo, então? Vamos "Em busca do tempo perdido."

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