segunda-feira, 21 de julho de 2008

O escafandro e a borboleta


A história de "O escafandro e a borboleta", um filme (produção EUA-França, dirigido por Julian Schnabel, estrelado por Mathieu Amalric, 2008) baseado no livro homônimo, é conhecida: o editor da Revista Elle, Jean-Dominique Bauby, em um dia trivial, sofre um AVC (acidente vascular celebral) e se transforma em um prisioneiro dentro do próprio corpo. Detentor da síndrome 'locked in' o 'bon vivant' mantem a plenitude de suas faculdade mentais mas somente controla o movimento de um dos olhos e passa a se comunicar com o mundo com o piscar de olhos (um para sim; dois para não) em que reconhece as letras do alfabeto, ditadas na ordem da freqüência de sua utilização, passando a formular palavras e orações neste lento processo.

Prisioneiro em seu escafandro, Bauby preserva integralmente suas faculdades mentais e aguça sua percepção para revelar uma verdade muito dolorosa: de algum modo, como Bauby, também estamos presos em escafandros.

Bauby somente se conhece e revela inteiramente sua personalidade quando quase não tem mais condições de se exprimir; castrado pela doença, percebe, com acuidade, nuances e matizes que não imaginava que a vida pudesse ter tão plenas.

Na agitada vida de editor da Revista Francesa, Bauby era insensível para tudo que mais poderia ter sentido para ele mesmo: distraído entre um desvio (um carro novo, por exemplo) e outro (uma nova amante) mal conseguia manter um interesse sincero por qualquer coisa.

No sofrimento intenso, passa a distinguir o que realmente importava para descobrir que simplesmente deixou a vida passar, sem ter mais como aproveitá-la integralmente.

A maior angústia do editor de Elle não foi sofrer um acidente que o deixou em um estado físico quase 'vegetativo': a maior angústia foi, depois da doença, passar a compreender a verdadeira dimensão da própria vida. Bauby descobriu, na doença, a razão e o significado para cada dia sem poder mais dispor do dia.

Restou, apenas, a lembrança melancólica de não ter assumido sua vida plenamente enquanto podia ser qualquer coisa. Bauby desperdiçou a vida ao preocupar-se com o que não devia e ocupar-se com o que não lhe importava; perceber o que lhe era caro não o salvou por não poder mais aproveitar a inteireza de cada coisa. Bauby perde o momento: quando descobriu um sentido para a vida era tarde demais.

Mas não serão estas as nossas maiores angústias também?

Temo que seja a minha...

Ainda há tempo para construir os sentidos, mas o que pode nos impedir?

Um comentário:

BSSR disse...

Porque não pude perceber,
aquela estrada, aquela flor, aquele adeus...
Perdi-me em vazios cinzentos,
achando poder me encontrar,
preso em tantos tormentos,
e em vãos sentimentos,
não vi teu pesar...
E agora, preso, vou derretendo,
sangrando.
Parto com a dor infinita
de não ter dito a última palavra,
a nossa palavra,
apenas sinto,
apenas estou indo... em lágrimas, que já não dizem nada.